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sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Amarelo - Sergio Martins






Entre tantos livros e minha coleção de vinil achei um caderno amarelo atrás do armário, qual desfolhagem de outono, e numa folha empoeirada de velhice lia-se um amor em felicidade.
Eu lhe escrevi cartas loucas e lhe entreguei um poema, mas, distraída, ao passo que eu lhe contava “estórias”, dormistes... Você cantou e inibiu-me, dispersando outro poema para longe - de mim...
Foi destoado o tempo todo em que a chuva nos trazia as canções de namorar, pois vimos as sementes de amendoeiras e nossos ipês de agosto sem nunca acharmos o mesmo tom... Enquanto mais uma magia expirava como se todos aqueles fevereiros fossem apenas fim de carnaval, um tipo louco de poema floriu e descobriu-me – dos vazios, dos beijos vãos, dos abraços doloridos - feito um amante reencontrando o indesejado inverno nas páginas antigas e amareladas de seu caderno de poemas.
No tal caderno, desenhado no papel envelhecido, até o sol, o mar, as flores e meu sorriso tinham a mesma cor... É que ela – a poesia - também me deixara assim (no belo e triste amadurecimento de velhice precoce que tem somente o apodrecimento de um tempo feliz): amarelo.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Baby Please - Sergio Martins






Eu tentava em vão fazer o “Baby, please” na minha gaita vendo ao longe o tingimento do sol matutino sobre os prédios na sombreada e vazia avenida onde os Abricós de Macaco floriam maravilhosamente... Do seu quintal, o cheiro forte e agradável da terra me faziam questionar sobre a razão de ainda estarmos sob o alucinógeno dessa grande cidade quando nosso lar no interior nos reserva tanta felicidade...


Ao tempo que num profundo sono você se entregava, tentei imaginar os abrigos confortáveis e os prazeres que te punham em cárcere, como se as luzes e os adornos dessa cidade fossem entorpecentes de euforia... Talvez, antes de o sono lhe confortar, você também se indagasse: então são estes os sonhos que me furtam a vida...? Mas lhe deixei dormir... Sim, eu lhe deixei, assim como se deixa um maço de belos Crisântemos sobre o túmulo de quem se ama. E novamente, pela avenida floral, cansado e frígido, tentei em vão fazer o “Baby, Please” na minha gaita.


quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Soneto em solidão - Sergio Martins




Em solidão lírica e amiga, no quarto frio de menina,
entre rosas e brancas, perfume e choro de unguento,
como se o mundo fosse liberdade de apartamento
e minha vida negra tivesse a luz do olhar de felina... 

Em solidão e faminto, sacio-me ofertando um poeminha...
O sorriso da moça vem após seu elétrico cansaço...
Alegrinha e trêmula, refugia-se em gemido e abraço...
Ah, se tu fosse criança, entenderias a felicidade minha!

Em solidão e bem velado, durante a noite ou de dia,
estou na paz de minha antiga e estranha alegria
- sobre o colo da louca amada que me acaricia.

Em solidão e dormente, as tardes errantes me aliciam,
a noite e a mulher entorpecem as estrelas e me remediam:
de manhã, tenho o que não há no divã, na igreja ou na drogaria.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Florbela - Sergio Martins






É namoro de sambar,
verão de “endoidar”
num amor de se molhar,
nesse prazer de vira-mar...

Fevereiro sorriu pra mim,
o sol mais forte despontou,
pelo caminho de onde vim,
(morena) Florbela desabrochou...
No Carnaval feliz, meu mundo se enfeitou
como se todo o amor sonhado tivesse “a fim”
e neste coreto, está em cinzas o que nos acinzentou 
onde já são mitos, desgosto de Colombina e Arlequim.


segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Assombração - Sergio Martins






Foi num domingo que a – louca – amada furtou minha televisão.
Na segunda vez, levou minha cama e o sofá.
Na Terça de Carnaval destruiu meu Abadá.
A Quarta foi magoada folia com chorinho, todo meu mundo sem chão
e, mesmo ao lado dela, a casa ficou vazia – minhas cinzas sem ressurreição.
Na quinta-feira – meu dia de folga - não tive geladeira nem fogão.
Na Sexta, mais volúpia, cama a dois, promessas de regeneração...
Até chegar meu Sábado de Aleluia em que ela trouxe muita aporrinhação,
daí, aborrecido de viver só pra morrer, parti de Finados à poética remissão:
em alforria boêmia ressurgi no bar em boas companhia e diversão, 
livre, definitivamente, daquele ebó-amor de assombração!

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Baunilha - Sergio Martins






                                                             
Juntos, sempre temos várias cores e belas frutas a conhecer, mas seu perfume lembra-me a baunilha de outros tempos... "Baunilha de meu sublime chocolate, flor de favas negras...!" Pensei ser, a necessidade primária, os sabores e a degustação das pomas de teu intrigante corpo; porém, teu aroma doce e único revelou-me a razão mais profunda, a essência de um amor singular que você, de pouco em pouco, desembrulha de minha alma, como se abrisses as gavetas da alegria – de minha infância que sempre revivo ao seu lado... 
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