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terça-feira, 26 de julho de 2011

Soneto para menina - Por Sergio Martins





"Nunca mais" é muito tempo. É tempo nenhum.
Aprendi a me contradizer, restaurar o sorriso,
esperar só o que me espera; de modo algum,
deitar-me à sombra do avesso em que piso.

A mesma lua que vi em seu quarto minguante,
hoje é cheia, grávida de alegria: farol divino
sobre a escuridão do mar. E já é distante
todo acorde, dedilhar e solfejo em desafino.

Até de relâmpagos e raios saem cifras de luz e calor,
a vida é partitura que se lê para o prazer da alma,
e no negro violão não se toca mais dissonante amor.

Quando eu sentir que é tarde não vou me esquecer
de namorar (essa poesia), e tudo será belo e calma:
Vitória-régia cujas flores são reveladas ao anoitecer.


terça-feira, 19 de julho de 2011

Dê-me - por Sergio Martins





Dê-me teus maltratos e tua hipocrisia; te ofertarei as flores que plantei para ti.
A aridez vai esculpir em teu coração a necessidade de minha água fresca e o frio te lembrará do meu colo macio.
O rancor vai suprimir tua juventude ao passo que você quererá a beleza e a força daqueles poemas.
Dê-me toda a culpa, tuas mágoas e medos, lance sobre mim sua rebeldia, pois só eu conheço a verdade de teus olhos.
Apanharei todo seu desafeto e servirei como adubo aos campos florais, à terra de nossa infância  onde dançamos ao sol: lar onde nós, amantes, dormiremos juntos e em paz para sempre.

Imagem: Google

terça-feira, 12 de julho de 2011

Inverno em escuridão - por Sergio Martins


Antes de amanhecer, a neblina encobre o bosque, a algazarra de espíritos sombrios harmoniza o labirinto de árvores acima do pântano, e assim adentramos o tenebroso caminho, pois o desejo que nos une é de fugir da simplória vida humana.

O inverno na escuridão da madrugada é liberdade, a paz é tão viva no cemitério das ilusões, e eu me apaixono todos os dias pelo mesmo cadavérico amor– quão belas são as luas cheias em teus olhos, amada morte minha!

Enquanto os vivos dormem, fugindo de suas feiuras existenciais, o frio nos acaricia, a fuga já não tem razão, e desejamos a mesma fogueira: nossa arte brilha mais que a dor, pois matamos o que nos matava para eternizarmos nosso amor.

Agora, toda a nossa festa no mundo dos mortos de tanto amar, é como um sorriso (sarcástico de Deus) diante das loucuras da desumana Terra.  



Imagem: Google

terça-feira, 5 de julho de 2011

Bossa - por Sergio Martins

                                                                                                                                                                   


De grãos crepusculares foram os beijos, o desejo que flutuava sobre a passageira estação, 
a fogueira branda enfumaçando o pacto de amor...

O mundo festivo se tornou neste belo corpo falecido, abraçado à insensatez das horas, mergulhando o véu e a grinalda na lembrança romântica: a brisa matinal se levanta enquanto a moça se deita sobre a areia da praia, observando a maquiagem desfeita no espelho d'agua, que clareia e reflete o céu nuvioso e calmo – que se tornou o seu embaçado rosto.

Velado pela lua minguante, o buquê de rosas casamenteiras se enterra na areia qual crisântemo– vida suprimida no túmulo. Silente, a noiva abandonada guarda sua aliança nas ondas, degusta o nobre champagne, desenha um coração na maciez úmida que se desfaz na amarga espuma, rega seu vestido ouro branco com flores chuva de prata; mas nada procura, nem mesmo quer se encontrar, apenas se entrega à força da natureza.

Defronte ao mar, que canta a eterna bossa de sua melancolia, todos os dias as ondas entoam a mesma marcha fúnebre, afogando os sonhos, lançando à areia as lembranças felizes, levando o espírito que insiste em se apegar ao corpo funesto corpo. 




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