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quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Do fim do caminho por Sergio Martins


Senti as brisas matinais das primaveras, tentei eternizar os crepúsculos outonais em telas e em escritos, descrever meu íntimo nas noites de verão e dissecar a tristeza dos invernos, mas só descobri mais possibilidades de me encontrar nos caminhos que cediam ruas para eu me perder. E assim, as coisas e as pessoas se voltaram para mim com um novo olhar – pois, tudo o que mudava a minha volta, voltava para mudar tudo em mim, daí a minha estranha visão para o mundo–: as doçuras e amarguras que degustei, as bebidas que provei, os sonhos que me subtraíram o sono, os desejos que me sobrevieram sem permissão alguma, meus desatinos e decepções, meus textos simplistas e repetitivos, meus desenhos tortuosos, minhas músicas defeituosas...

Tudo. Absolutamente, tudo me deu a certeza de que caminhei à vela dos melhores ventos. Em contrapartida às duras penas me foi revelado o tal pulo do gato, de modo que, não apenas contemplei de longe a terra prometida como também abracei o amor à vida e a paixão por essa contraditória existência, ouvi o silêncio divino das montanhas e a sinfonia poética da mulher amada que aprendi a conquistar e apaixonar-me todos os dias, respirei e prendi o romance cotidiano ao meu ser em meio aos anseios capitalistas, de Graça recebi e cultivei extraordinárias amizades, abri mão das vaidades fúteis, experimentei a alegria vívida da criança que nunca se retirou de mim e jamais deixei de criar a arte nos apertos do gueto emocional.

E agora, prostrado à sombra do fim do caminho, o frio todo dessa morte lenta é amenizado pelas chamas que se fortalecem alimentadas pelo encanto da terra em que me enlaço com gratidão. Portanto, ante à iminente e eterna despedida, pelas mãos dos que me amam, arremesso um maço de nobres Crisântemos e uma coroa de Rosas aromáticas no túmulo-altar desse solo paradisíaco, convicto de sossegar totalmente deleitável pelas bênçãos existenciais e que tive um envolvimento de ardente amor com a imortal felicidade e com a sagrada tristeza mesmo nos atalhos em que a escuridão pareceu-me enlouquecer. Enfim, de tudo o que adquiri e que me foi furtado, que vivi e fiz valer e viver, levarei a poesia. A beleza eterna que Deus me apossou e com a qual me casei para além-mar.

Foto: Google

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