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sábado, 24 de fevereiro de 2018

Dos olhos que são poesia - Sergio Martins





Em meio à guerra, o ato de maior subversão é o olhar poético. São dele, a insaciabilidade pela beleza, o desejo pelo Éden, o desespero pelo prazer, a ânsia pela vida sonhada... Ele é o modo mais cristalino de pensar a vida, pois nele não há o embaço da realidade...

Meus olhos são subversivos e, sobretudo, espirituais – direcionados às flores do meu quintal, velas acesas no apagão existencial, pois devotam luzes de alegria ao altar-mor... Nesse instante, estou novamente no jardim – da infância – em comunhão com o sagrado. Penso que Deus seja, como pensou Fernando Pessoa, uma criança que brinca no jardim. Jesus pensava semelhantemente: "quem não se tornar como uma criança jamais verá o Reino de Deus".

No crepúsculo matinal, vejo que as florezinhas estão molhadas, e lembro-me de Vinícius de Moraes: “A felicidade é como a gota de orvalho numa pétala de flor”. A cada dia o cuidado divino nos alcança na proporção que precisamos, daí, não haver a necessidade da inquietação pelo dia de amanhã – basta a cada dia o seu mal...

Às 18 horas, o sino da igreja me aconselha: Tempus Fugit! Carpe Diem! Eu sorrio, convicto de ter colhido com os olhos todo o presente do meu dia...

Ao anoitecer (regarei as flores – a arte do cuidado dá sentido à vida), essa rotina dos olhos poéticos me traz a novidade: estou pronto para um novo dia. Apesar da guerra, hei de chamá-lo de presente – feito criança diante de um mundo a ser descoberto...


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