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sábado, 2 de novembro de 2013

Afrodite - Sergio Martins






    Afrodite era a menina mais linda da favela. Não demorou muito para que ela fosse assediada pelas agências de moda.
Nunca soube exatamente o seu nome; mas na infância, chamavam-lhe de Dite. 
    A bela menina, por ser afrodescendente, recebeu o apelido de Afrodite. Ainda pequenina, ela desceu o morro e subiu na vida: trocou as sandálias gastas com as quais sambava na quadra da favela pelos saltos altos nas passarelas de todo o mundo. 
    Naquele época, eu era um menino assustado com o mundo e aquele era um tempo tão difícil que nunca consegui falar com Afrodite ou sequer esbarrar em seu braço pelas vielas do gueto. Certa vez, de cima da minha laje no alto do morro, a vi pela única vez daquela posição; não imaginava que jamais alguém poderia ver Afrodite de cima para baixo. Quando decidi olhar fundo em seus olhos e finalmente ouvir sua voz, ela já havia ido embora. Agora, a Deusa da Beleza não é mais Afro nem Dite e em seu trono num arranha-céu, assiste às notícias da favela com desdém; trancafiada no paraíso solitário e entediante dos deuses.

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