
O mundo contemporâneo e suas formas de interatividade reafirmam que somos essa contradição: ninguém é uma ilha - no universo onde todo homem é uma ilha.
Distante da multidão, o mundo atual experimenta a nova solidão, a que é compartilhada-todos estamos unidos pela mesma solidão. Fugir disso é se prender numa dolorosa utopia, porque o confinamento nos permite refletir sobre o que realmente representa a liberdade do corpo e da alma... O caos revela os segredos escondidos e esquecidos pela distração: retornar aos afetos e aos prazeres da solidão, de modo que a busca de si no outro é um engano doentio e a dependência emocional é a violência contra o único caminho da paz interior, pois cada um tem suas próprias digitais, sua identidade e suas saídas...
Na solidão, entendemos melhor o inferno que são os outros - os que tentam matar a querida amiga solidão. É que a solidão representa vazio para muitos... Acho, dentre outras questões, que o pavor de estar em solidão é ausência de criatividade: “Se você não encontra o sentido das coisas é porque este não se encontra, se cria”. (Saint-Exupéry) Todo confinamento é crise se não tem criatividade, a novidade poética nos olhos que faz as manhãs serem novas e únicas... É claro que todo paraíso é entediante quando não há com quem compartilhá-lo, mas é a solidão que nos aproxima de nós mesmos e, distante de si, nenhum ser consegue se achar - bem no outro.
É óbvio que tenho saudade da vida sem quarentena, mas para mim, que vivo em recolhimento, a solidão é uma divindade indispensável à vida, portanto, como escreveu Nietzsche, também “Detesto quem me rouba a solidão sem em troca me oferecer verdadeira companhia”; isso porque, todos os que os que repudiam a solidão sempre me ofereceram seus violentos vazios, de modo que parodio a música: Ter saudade até que é bom, é melhor que caminhar COM OS VAZIOS.
Quando a solidão não é doença e isolamento social não é apartheid, compreendemos, que a pior\real morte é experimentada em vida - em todo o tempo que desperdiçamos em ressentimentos e tristezas insanas e não desabrochamos o amor, perdendo-nos do caminho da paz. De resto, permaneço separado, embora junto na mesma solidão secular, pois “A natureza dos homens é a mesma, são os seus hábitos que os mantêm separados”. (Confúcio)
Retornando à contradição, eu preciso de outros sentidos, os que representam não-sentidos para o senso comum: “Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada”. (Clarice Lispector)