Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Pus-me a observar aquele homem durante muito tempo, notando nele o abismo que traduzia meu ser - "E se tu olhares, durante muito tempo, para um abismo, o abismo também olha para dentro de ti”. (Friedrich Nietzsche)
Sair à rua é como brincar de roleta russa e o isolamento é pique-esconde com o bicho malvado... Eu brigo neste pique-pega infernal: o bicho pega o homem que pega o bicho...
O bicho está pegando!!!
Escrevo pela ilusão de eternizar a beleza, pois é dessa poética que se alimentam os amantes da arte. O que realmente interessa-me é não frear o impossível: controlar as palavras - é a arte quem me guia. No momento em que as palavras me conduzem, mesmo levado pelas ilusões, exponho minhas únicas verdades... É nisto que contém sentido: tornar-me legível (para mim mesmo) mesmo com certa medida de obscuridade.
quinta-feira, 26 de março de 2020
Ensaios antivirais - parte III - Sergio Martins
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